Muito se fala sobre a necessidade de a escola promover a Educação Socioemocional dos alunos. Não pretendo aqui discordar dessa afirmação, visto eu ser, não apenas defensora, mas profissional engajada nessa causa. Entretanto, uma pergunta nunca se cala em minha mente inquieta: como a sociedade pode demandar que os professores promovam a educação socioemocional de seus alunos, quando eles mesmos não tiveram a oportunidade de serem formados para tal? Qual dos professores (e eu me incluo nesse grupo) foram educados “socioemocionalmente” ao longo dos muitos anos que frequentaram a escola?

Sendo a grande maioria dos professores objeto de uma formação voltada à aquisição dos conceitos teóricos incontestáveis e das práticas didático pedagógicas que reinam no momento, não lhes é facultada a oportunidade de refletir sobre questões básicas, mas muito profundas e necessárias como: quem sou eu? Qual é a minha verdadeira identidade? De onde vem e como posso lidar com todos os pensamentos e emoções que afloram dentro de mim a todo momento? Como posso manter o meu próprio equilíbrio emocional quando as demandas emocionais dos meus alunos são tão grandes? Como posso desenvolver minhas competências de função executiva ao mesmo tempo que auxilio meu aluno? Como posso ajudar meu aluno a ser mais focado, mais atento, quando eu mesmo me pego “divagando” em muitos momentos?

Eu gostaria de tranquilizá-los nesse momento, dizendo que existe, sim, uma forma rápida, eficaz e que demanda pouco tempo e esforço por parte dos professores e das instituições educacionais, que transforma o professor em um ser socioemocionalmente educado, ou seja, um ser sábio, equilibrado, focado, eficiente, socialmente hábil e que ainda leva seus alunos a excelentes resultados!!!

Caros leitores, lamento desapontá-los, mas esse “pózinho-de-pirlimpimpim” não existe! Não existe fórmula mágica! Coloquemos os pés no chão! É necessário muito trabalho, esforço e determinação das instituições educacionais para se percorrer esse caminho com sucesso.

A educação socioemocional dos alunos como contemplada nas competências gerais da BNCC/2017 e que já entrou em vigor esse 2020 não é possível de ser alcançada se as instituições educacionais não investirem na formação socioemocional contínua e sistemática de seus professores. Uma palestra aqui, outra acolá ou mesmo uma série de encontros sobre assuntos diversos desconectados, que visam ensinar os professores a ensinarem, sem se desenvolverem primeiro, não leva a resultado algum.

Os professores somente desenvolvem competências didático-pedagógicas nessa área por intermédio do desenvolvimento sistemático e evolutivo de suas próprias competências socioemocionais. Isso, sim, lhes permitirá trabalhar questões de alta complexidade emocional e de função executiva com seus alunos. É necessário um sistema de formação de professores que lhes propicie a construção de um alicerce para o trabalho pedagógico nessa área especificamente, assegurando-lhes primeiramente o desenvolvimento da consciência de si mesmos, da potencialidade de seu cérebro, de como suas emoções e seus pensamentos funcionam e se integram, de suas forças pessoais e de como se tornarem mais hábeis socialmente. Por meio de diferentes práticas, assegurar aos professores uma formação integral baseada no desenvolvimento de sua própria função executiva e de sua inteligência socioemocional.

Aos professores é necessário disponibilizar oportunidades que lhes conduzam a intensas mudanças provocadas pelo autoconhecimento e afirmação de sua identidade, em relação a si mesmos, aos colegas de trabalho, à família, aos amigos e aos alunos. É necessário ir além, questionando e construindo valores, atitudes e competências úteis para si mesmos, para o trabalho e para a sociedade. Por fim, precisamos contribuir para que os professores desenvolvam resiliência ao lidar com os mais variados sentimentos que a vivência diária em sala de aula lhes impõe. Sentimentos que precisam ser trabalhados para que possam ajudar seus alunos a superarem os desafios de grande complexidade que a realidade atual lhes apresenta.

Os professores precisam ser beneficiados com uma escuta ativa, mais disposta a entender e dialogar com suas formas próprias de expressão, sentindo-se acolhidos e respeitados. Somente assim, vão se dispor a fazer o mesmo por seus alunos. Além de desenvolverem competências essenciais como controle da atenção focada, organização e resgate de memória mais eficientes, também precisam aprender a lançar mão de intervenções cognitivas para regular suas emoções, diminuindo a ansiedade e promovendo sua saúde mental.

Concomitantemente, os professores também precisam ter acesso a um programa consistente de desenvolvimento socioemocional para seus alunos que também promova desenvolvimento de suas funções executivas e potencializem seu aprendizado. Leituras sobre assuntos randomizados, aulas conceituais, participação em jogos sem saberem para que os mesmos servem, ou mesmo tratar a inteligência socioemocional como tema transversal apenas resvala um aspecto do desenvolvimento humano tão complexo e necessário. Os professores precisam ter acesso a; 1) uma trilha de aprendizagem que contemple sequências didáticas que assegurem que a intencionalidade de cada aula seja alcançada; e 2) práticas escolares diferenciadas, organizadas em torno das vivências e dos interesses dos alunos e apropriadas para cada faixa etária.

Ao longo da Educação Básica os alunos passam por intensas mudanças decorrentes de transformações biológicas, psicológicas, sociais e emocionais, sempre em busca de conhecer e afirmar sua identidade em relação ao grupo a que pertence, seja esse grupo a escola, a família, ou os amigos. Ao longo da Educação Básica, os professores são confrontados por valores e atitudes diversas que os alunos trazem de sua convivência familiar e comunitária, assim como lidam com seus sentimentos de inferioridade e baixa autoestima diante dos desafios acadêmicos e pessoais e da elevada ou baixa expectativa das pessoas de seu convívio.

Apenas através de uma formação sólida e acompanhamento especializado continuado, os professores se fortalecem e instrumentalizam para conduzir os alunos ao reconhecimento de suas potencialidades, acolhimento de suas memórias e experiências, desenvolvendo sua capacidade crescente de realizar operações cognitivas, cada vez mais complexas, e sua sensibilidade para apreender o mundo, expressar-se sobre ele e nele atuar, o que determina a maneira de como os alunos se relacionam consigo mesmos, com os outros e com o mundo. A ampliação da autonomia intelectual, leva os professores e alunos a uma maior compreensão da dinâmica da sociedade, maior interesse por interagir com sistemas mais amplos, e a ter maior discernimento diante das escolhas para suas vidas. Integrando a formação socioemocional de professores e alunos, esses se tornam protagonistas e autores de suas próprias histórias, reconhecendo suas forças e enfrentando os desafios que desenvolver-se socioemocionalmente apresenta.

Silvana Vacillotto
Silvana Vacillotto
Atualmente atuo como Coordenadora de Desenvolvimento Pedagógico da Brain Academy, mas entre outras coisas, fui Orientadora Educacional do SENAI-SP; Assistente de Pesquisa em Psicologia da Educação na University of Nevada, Reno; Mestranda na University of Illinois, Urbana-Champaign como Fulbright Scholar, e desde professora até Diretora Acadêmica do Centro Binacional de Belém-PA. Minha paixão: ajudar o ser humano a se desenvolver!

Que tal compartilhar seus pensamentos?

Envie seu texto para Maewa Martina (maewamartina@brainacademy.net.br)