Diante da pandemia, as alterações mundiais foram (e continuam sendo) incalculáveis. Uma das maiores mudanças se deu com o fechamento temporário das instituições de ensino que, de modo repentino e obrigatório, tiveram de se reconfigurar para dar continuidade ao processo de aprendizagem de milhares de pessoas.

Com isso, o ensino à distância (EAD) foi aconselhado para minimizar o impacto negativo sobre a educação. A Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) foi uma das primeiras organizações a publicar uma lista com recomendações sobre o ensino à distância. A lista indica que sejam escolhidas as melhores tecnologias para as escolas, de acordo com o sistema de comunicação da sua área e capacidade tecnológica; sugere a reorganização do calendário escolar; recomenda a criação de comunidades de professores, pais e diretores para que sejam asseguradas as interações humanas regulares, a fim de combater, inclusive, o sentimento de solidão, facilitando a troca de experiências e discussão de estratégias para enfrentar esse momento de dificuldade.

Das dez indicações apresentadas na lista mencionada, destacamos a segunda recomendação: “Assegure-se de que os programas sejam inclusivos a todos os estudantes”. Com essa leitura, podemos questionar: como tem sido feito, na prática, o ensino da Educação Especial à distância?

Apesar de o EAD ser reconhecido no Brasil há 24 anos, estando contemplado no art. 8, § 5º, da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), e tendo a oferta destinada a todos os níveis de ensino, inclusive para o público-alvo da Educação Especial, não há cultura de uso exclusivo dessa modalidade para esse público, o que pode gerar uma série de questionamentos, haja vista existirem complicadores pré-existentes quando se refere ao ensino destinado a eles.

Embora possamos identificar uma série de avanços relativos ao ingresso do público-alvo da Educação Especial nas escolas comuns, muitas discussões sobre os aspectos educacionais, sociais e políticos relacionados à inclusão têm sido realizadas, justamente porque, ao longo das décadas, não temos atingido nossa principal meta: garantir a educação de qualidade.

Pesquisas científicas têm demonstrado que ainda existem práticas segregadoras, que ainda se encontra irregularidade na elaboração dos diagnósticos, que há ausência de monitoramento dos diversos serviços oferecidos, e até mesmo precariedade na formação de profissionais.

Esses fatores nos levam a acreditar que se não houver estudo, planejamento estratégico, bem como coerência no uso do EAD, ao término desse período, poderemos retroceder em relação às conquistas alcançadas com muito esforço pelas famílias e profissionais envolvidos.

Nesse sentido, algumas reflexões devem ser feitas para redimensionar o que pode ser feito nesse período. Em primeiro lugar, precisamos compreender que a prática do EAD por si só não é segregadora, ela somente terá esse caráter se o uso estiver sendo inadequado, equivocado ou incompleto.

Em segundo lugar, ao considerar a prática do EAD, precisamos contar com o apoio das famílias sem exigir demasiadamente, sem atribuir a eles o compromisso de serem coprofissionais. Somos nós que possuímos competência técnica para tal e é inclusive por esse motivo que teremos condições de elaborar e delimitar estratégias inclusivas (especialmente individualizadas) para serem assistidas ora pela família, ora apenas por nós mesmos, especialistas.

Em terceiro lugar, podemos aprender algo positivo com essa situação, considerando que a escola é uma esfera da sociedade. Mais do que nunca, devemos lutar pela mudança de paradigmas, para redimensionarmos o papel da escola e da sociedade, e tentarmos construir, ao menos agora, a sociedade que realmente queremos, onde possamos acolher a diversidade humana em todos os âmbitos.

Em quarto lugar, em tempos de colapso econômico, é essencial pensarmos em políticas de combate às desigualdades históricas e sociais, tendo-as como prioridade não apenas em tempos de pandemia, mas enquanto uma constante, enquanto uma meta para reduzirmos o abismo social que cresce a cada minuto.

Com isso, acreditamos que as políticas de inclusão devem existir para dar a esses alunos o acesso aos serviços públicos, garantindo que a segurança e a defesa dos direitos, que estão em maior risco nesse momento, sejam mantidas e até aprofundadas.

No contexto de quarentena, não podemos admitir que a Educação Especial seja esquecida. Precisamos assegurar que esses alunos tenham a mesma oportunidade de aprendizagem e condição para se desenvolver que os demais, que eles possam vivenciar as experiências virtuais com criatividade, diversão e com respeito às suas especificidades e emoções, à sua vida.

Dra. Maewa Martina
Dra. Maewa Martina
Doutora e Mestre em Educação. Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional e Atendimento Educacional Especializado. Atualmente é Professora Universitária e de Educação Especial. Integra a equipe de Desenvolvimento de Conteúdos Pedagógicos da Brain Academy.

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